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A mostrar mensagens de agosto, 2019

As voltas que demos para aqui chegar

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“O amor está por reinventar” - Rimbaud                                                                                                                             “As voltas que demos para aqui chegar ”, em tradução livre para The Turns We Took, é mais uma das elegantes referências dos Tindersticks. Onde muitos dos seus contemporâneos da música indie são directos nas suas letras, os Tindersticks elaboram canções densas com uma forte dimensão literária, de entrelaçadas melodias, vocais que muitas vezes mais parecem murmúrios, com orquestrações assumidamente melancólicas, e que perpassam os nossos fantasmas. Em essência, filtraram o romantismo da estética indie roc...

BATOM DO HOLOCAUSTO

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                                                                   Imagem e texto retirados da Exposição na Coudelaria Nacional,  Bansky génio ou vândalo? Um excerto do diário do tenente-coronel Mervin Willett Gonin Dso, que estava entre os primeiros soldados britânicos a libertar Bergen-Belsen em 1945:   “Eu não posso fazer uma descrição adequada do campo de horrores em que os meus homens e eu passaríamos o mês seguinte das nossas vidas. Era apenas um local ermo e seco, tão despido como um galinheiro. Cadáveres jaziam em toda a parte, alguns em enormes pilhas, outras vezes isoladamente ou aos pares, no lugar onde tinham caído. Demorou um pouco a habituarmo-nos a ver homens, mulheres e crianças a sucumbir quando passávamos por eles, e deixarmos de ir em seu auxílio. Tínhamos de nos habituar ...

A MONTANHA MÁGICA: FIM

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HANS CASTORP                                                                Imagem: Caminhante contemplado um mar de nevoeiro, Caspar David Friedrich, 1817/18.                  “Hans Castorp não era um génio nem um idiota, e se evitamos o termo “mediano” na sua caracterização não é, de modo algum, por razões que se prendem com a sua inteligência ou com a simplicidade da sua pessoa, mas sim por respeito para com o seu destino, que, assim nos julgamos inclinados a acreditar, comporta um determinado sentido sobre-individual ” pág.44. Não podia acabar esta série de textos sobre A Montanha Mágica sem dedicar particular atenção ao personagem principal Hans Castorp. Se A Montanha Mágica , ou mesmo se a obra de Thomas Mann está fora de moda, é porque continua a...

MUSEU DA VIDA ROMÂNTICA

Podes não atender o telemóvel, e mesmo assim eu converso contigo; não abrir a porta, e eu estou do outro lado. Em virando o olhar da fotografia, sabe que sou sombra e sou também luz, esquina escura onde guardas a ficção e alta escada diurna, sem esconderijo, no caminho onde buscas o triunfo.  Quando estiveres na cama, aquele corpo de outro a teu lado será este corpo, porque sou a alma e me hás-de procurar;   e nem sou o chão nem sou as pedras, não, não te percas, sou o côncavo do solo onde a pedra assenta para tu passares. Quanto mais tentares calar-me, mais cartas minhas receberás; bilhetes curtos, se não romances: vivo de papel. A cada carícia que recusares, a tua mão de gesso vai apertar minha forma dorida. Convidaste-me a entrar e a lei da hospitalidade é o que agora nos vincula sonâmbulos. Mas não te quero ofender, nem trazer sofrimento ao peito onde pus a língua. Quero só dizer-te que te inventei porque me p...

A MONTANHA MÁGICA VIII

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  LEO NAPHTA                                                               A imagem é de uma fotografia de Walter Hahn da cidade de Dresden destruída.   Leo Naphta é, talvez, o personagem mais controverso de toda a história da literatura. Se Settembrini incorpora as tradições políticas europeias constitucionais, democráticas, racionais e seculares; Naphta agrega todos os principais temas comuns às ditaduras, a saber, o radicalismo nas suas vertentes, tanto fascistas quanto comunistas. É apaixonadamente anti-burguês, anti-capitalista, hostil à modernidade, à liberdade, à individualidade e ao progresso, e materializa as tradições políticas autoritárias e religiosas. É um ex-judeu convertido ao cristianismo e, o seu zelo religioso impede-o de ser um pacifista: " Maldito seja o homem que impede a sua es...

Let me kiss you

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“Beijos escritos não chegam ao destino, são bebidos pelos fantasmas durante o caminho.” - Franz Kafka (Cartas a Milena)                      Se para Kafka os meio de comunicação escritos, como as cartas, pela sua linguagem maneirista, são fantasmas que privam o mundo de realidade, fazendo-o parecer inapreensível, que dizer daquilo que é por natureza incorpóreo, como as imagens que alimentam os nossos desejos?                                                                  É curioso como numa época em que podemos viver com a maior liberdade, em que os relacionamentos de um modo geral se tornam fluidos e incapazes de representar qualquer estabilidade minimamente coerente num universo de valores, continuamos a arrastar cadáveres emocionais e a tra...

A MONTANHA MÁGICA Revisited VII

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A NEVE O Canto do Cisne                                                       A impressionante paisagem  “Tempestade de neve: Aníbal cruza os Alpes”  (1812) de William Turner, é uma importante obra do Romantismo onde se descreve os elementos como expressão das sublimes e potentes forças da Natureza.  Também a obra de Thomas Mann foi aplaudida como uma obra de arte verdadeiramente moderna, sendo um herdeiro do Romantismo, “A Montanha Mágica” vem magistralmente desenhada também com todos esses traços. No capítulo a “Neve”, alguns deles, constituem uma verdadeira antologia de toda a História da Literatura Universal; o naturalismo, o inóspito, a subjectividade, o sonho e o lirismo. “A Neve”, o mais famoso de todos os capítulos, é considerado como o canto do cisne. É um poema sinfónico que surge directamente da pin...

Todas as canções são para ti

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                                                         Nina Simone e o Piano. Unidos com a finalidade de nos fazer estremecer. Todas as suas qualidades enquanto compositora parecem-me reunidas aqui. " My Father" está incluída entre as dez melhores canções para Nik Cave. É uma cover de uma canção original de Judy Collins, em que Nina Simone remove a conexão autoral para que não haja confusão com um pai que poderia ser considerado seu, alterando versos e omitindo estrofes. É a verdade autobiográfica que é superada pela sinceridade pessoal e pela verdade artística.   É uma canção de périplos solitários e sonho, em que se fala das promessas feitas pelo pai, a mais memorável seria a de viver em França e "navegar no rio Sena". A canção funciona como uma espécie de livro de memórias, em que a voz que nos canta recorda uma infân...