Uma última ilusão de esperança
Por estes celebrou-se o 211º aniversário do nascimento de Frédéric François Chopin. Digo por estes dias, porque não é consensual a data do seu nascimento. Podia carregar no amplamente conhecido lugar-comum e dizer que é um dos maiores compositores para piano e um dos pianistas mais importantes da história.
Mas dizer-se que as suas sonatas, as baladas e estudos são literatura obrigatória para qualquer melómano, já não é um mero exercício para entreter o spleen na prosa chã da comédia dos dias. Não.
É entregarmo-nos ao prazer.
Em – verdade – tal como sucede nos Scherzos e Baladas e outros géneros musicais, Chopin criou as suas próprias regras da Sonata. Senão vejamos. A Sonata nª 3 quando comparada com a Sonata nº2, concluída cinco anos antes, distancia-se do espírito trágico e da ideia de morte que prevaleciam naquela obra. Nas primeiras páginas a obra soa feliz e de uma vitalidade sã, bem longe das preocupações mórbidas da Sonata “fúnebre”. Em vários aspectos, a Sonanta nº 3 transcreve para o piano a arte do bel canto que Chopin tanto venerava. Ele aconselhava, aliás, os alunos a irem escutar os cantores de ópera e impregnarem-se da respiração lírica das obras de Bellini.
Contudo, à medida que avançamos na partitura, o sentimento de vitalidade esmorece. Qual a razão? Cinco anos antes da sua morte, que ele sabia estar próxima – Chopin não se iludia acerca da fragilidade do seu estado de saúde – a música tornar-se o seu último refúgio. “Ele fecha-se a todo o momento e tem um certo prazer nisso” escreveu a sua amada George Sand, fascinada e desolada ao mesmo tempo (Stéphane Friederich, Edição Ad Astra, tradução de Maria Portas de Freitas, 2010).
E não se enganava: não restam dúvidas que o coração da Sonata se situa no Largo aqui brilhantemente tocado pela Maria João Pires. Este terceiro andamento vem renovar o espírito do Lied e do Nocturno que paira sobre a obra, razão pela qual gosto tanto dele. Tantas (in)confidências que aqui se fazem em tom de íntima confissão...
Um estado de alma típico do Romantismo. Uma última ilusão de esperança?
Uma Sonata de profunda emoção.
Boa noite e bons sonhos.
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