Uma última ilusão de esperança II: variações sobre um tema

 

Cenas do episódio anterior:

Ao mesmo tempo que aqui se evocou o mito do criador (Chopin - o artista fechado sobre si mesmo) evocou-se o mito da sua obra: a obra-prima que é a Sonata nº 3, o respeito deste objecto único, insubstituível, fechado sobre si mesmo e levado ao máximo da plenitude.

Quando nas cenas do capítulo anterior disse que Chopin criou as suas próprias regras da Sonata, referia-me ao facto de Chopin se libertar dos constrangimentos da forma sonata clássica, a falta de coesão e unidade nos quatro andamentos da Sonata, é disso exemplo. Em lugar da forma clássica, surge então o poema ou drama musicado. As atmosferas já não se continham em sucessão umas das outras, em andamentos estanques. A sonata nivelava-se agora pelo romance literário, como uma epopeia mística e fulgurante.

Vamos repetir um excerto do terceiro andamento, visualizando-o desta vez, simplesmente, para admirar a finura e a delicadeza do segundo tema, a Marcha. Quando alguns compassos adiante julgamos poder escutar de novo o tema principal, Chopin adia o seu aparecimento e, surge então a Marcha.  Esta técnica de escrita com os seus arpejos contínuos iria inspirar figuras que não foram propriamente menores, como Claude Debussy e Gabriel Furé, que associaram à imagem de uma descida aos abismos profundos. Sim, o tema da marcha, é causador de uma profunda emoção. O que quer que o toque de Chopin expresse, ou a arte do seu fraseado, a sua “última ilusão de esperança”, é a  paixão pela beleza.

                                                          



Boa noite,  ó-ó  e caminha

 

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