O Timbre da Luz



                                                   
O uso da luz como metáfora, quer na temática formalístico-metafísica da filosofia e da teologia, quer no âmbito da poesia, é tão antigo quanto a humanidade. A luz tanto tem servido para ressaltar a ideia da revelação divina quanto para iluminar a verdade ou os mistérios do mundo.

Já os pitagóricos acreditavam que a alma tinha um princípio luminoso, até o próprio fogo unificador de Heráclito, tinha como único princípio explicativo subjacente a todo o cosmos, a luz. Já para não falar em Platão, em que se dá a transposição máxima da ideia da luz como revelação, quer dizer, não a luz natural que torna visíveis as coisas materiais, mas a luz que torna as formas inteligíveis, isto é, visíveis aos olhos do nosso espírito. E Deus, que carrega um nome cuja etimologia significa “luz”.  

                                                         

A luz é ela própria poesia, tendo no seu centro iluminado o milagre que a justifica. Desta percepção de primordialidade podemos entroncar a mais marcante e substancialmente poética das canções de Mazgani, Faintest Light. É uma canção demonstrativa do seu poder poético, porque é simultaneamente concisa e expansiva ao representar com grande economia de recursos plásticos, a melancolia enquanto modalidade de representação do mundo, e exercida enquanto ofício dos grandes poetas.

Este recurso estético e estilístico de escrever com tão poucas palavras, como num diamante bruto, trata-se de lapidar planos linguísticos e sons,  até que deles reste o que realmente importa: a luz que lhes advém.

Escrita para instrumentos de cordas, guitarra e violino pratilham entre si o fluxo sanguíneo da mesma veia lírica. A beleza cálida da sua voz em simetria com a melodia, conjugam-se para que a mais Faintest Light se insinue. Este timbre da luz, na sua mais fina tessitura, vamos repeti-lo, é a intimidade de uma poética que acaba por revelar um dos lados idiomáticos da sua música, deixando-nos num mundo de transcendente pureza espiritual

É uma canção sobre a luz de uma cidade, o halo que a envolve, e é no ressoar do seu acorde luminoso que a cidade se revela. Só através da luz correm os dias, só através dos dias corre o tempo, mas como diz o poema, é igualmente grande o olho da noite, em cuja profundidade repousa o brilho da luz. A título pessoal e intransmissível, podíamos perguntar de que profundidade vem a nossa mais faintest light, esta ordem terna da luz. Talvez o amor, a beleza e o desejo sejam precisamente mergulhar no espelho da luz; naquilo que os nossos sonhos se tornam intemporalidade, no que têm de primevo, de indistinguível, mas que estão sempre à espera de surgir, qual luz reveladora.

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