Um pretenso Coração das Trevas
Stanley kubrick (2001
Odisseia no Espaço), Francis Ford Coopola (Apocalipse Now, Christopher Nolan (Intersteller) e Terrence Malick (Árvore da Vida), deram à luz Ad
Astra, de James Gray, o seu último filme, estreado esta quinta-feira. O
realizador não esconde a parentalidade e agradece todo o trabalho feito antes
de si para poder chegar ao mesmo nível dos progenitores. Não chega, e destacam-se
mais as colagens do que uma identidade original.
Ad Astra
(em direcção ao espaço) é a história do astronauta Roy McBride (Brad Pitt) a
quem é confiada a missão secreta de viajar aos confins do sistema solar para
descobrir e neutralizar a origem das misteriosas descargas elétricas que
ameaçam toda a vida no planeta Terra. Essas descargas estão relacionadas de
alguma forma com o seu pai, Clifford McBride (Tommy Lee Jones), o lendário
astronauta que liderava o projeto LIME, cujo objectivo era descobrir
inteligência extraterrestre. Clifford e os seus colegas estão incontactáveis há
anos, pois nada se sabe do que aconteceu ao projecto, nem o que poderão ter
descoberto. “Ad Astra” segue assim a
estrutura narrativa de “Apocalypse Now”,
em que o papel de Marlon Brando é substituído pelo de Tommy Lee Jones e as
selvas do Camboja pelo espaço.
A viagem de
Roy MacBrid aos confins do nosso sistema solar à procura do pai, torna-se,
sobretudo, numa viagem à procura de si mesmo. O filme revela algumas fragilidades, na verdade, está mais próximo d’Árvore
da Vida do que do filme de Coopola - a omnipresente voz-off de Roy MacBride;
a busca da transcendência; do sentido da vida; os traumas parentais - são
pastiches de temas que perpassam a obra de Malick e, por isso, a suposta
profundidade emocional e filosófica de Ad
Astra, é decalcada, falsa. O filme é demasiado explicativo, sem mistério, e
não chega a ter um “estilo” como forma de compensar as suas fraquezas.
Ad Astra acaba por funcionar melhor quando
são postas de lado as pretensões filosóficas e psicológicas, e nos oferece
cenas básicas de acção onde se revela a sua criatividade. Mas até nas poucas
ocasiões em que James Gray decide ilustrar a sua visão do futuro e da tecnologia,
notam-se mais os decalques do que uma identidade própria, e acabamos por compará-lo
com os filmes nos quais se inspira.
O universo sonoro permite explorações tensas e complexas, e
há bons momentos de contemplação visual, Brad Pitt não está rodriguinho nem
excessivo, tem uma excelente interpretação, grave, contida, e tudo indica que este
será o seu ano nos óscares, o seu desempenho eleva mas não chega para suster Ad Astra.
Às personagens secundárias não é dado nem espaço nem tempo
para se poder construir a dimensão dramática que algumas delas exigem, não
passam de meros acessórios para fazer funcionar o filme. O personagem Roy
MacBride vive toda uma vida sobre o peso da heroicidade paterna, de tal modo
que decide seguir a mesma carreira de astronauta e, no momento em que descobre que
o pai afinal não é o herói, mas um assassino, e que está a pôr em perigo toda a
humanidade, esperar-se-ia estupefação e revolta (ainda que pueril), mas,
deparamo-nos com resignação… Sabe-nos a pouco. Não há aqui qualquer morte do
pai nos termos freudianos, isto é, da desconstrução dos pés de barro dos ídolos,
e toda a sua determinação e concentração na construção da sua personalidade, é
a procura de descobrir um meio adequadamente decoroso para a expressão “disciplinado”.
Tudo isto culmina num final de “ombros encolhidos” que serve para confirmar que
“Ad Astra” pretende ser mais do que efectivamente é.
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