MORRER AO TEU LADO
Dos elementos mais dinamicamente
surpreendentes dos Smiths era que, entre a sensualidade e a angústia, a ironia
e a crítica social, costumavam colar às suas letras uma matéria rítmica e
melódica de grande invenção e inovação. “There Is a Light That Never Goes Out” é
de uma intensa luminosidade musical que ressoa a um tempo e que se pode
condensar na seguinte fórmula: “live fast, die young, be wild, and have fun!” Se
estivéssemos numa aula de literatura, e se quiséssemos arranjar igual magnitude
em frémito passional, poderíamos falar em livros que influenciaram de facto a
vida real, como “A Paixão do Jovem Werther”, que inspirou uma onda de suicídios
na altura da sua publicação. E tudo por causa do amor. A analogia serve de
ponte para a opus magnum por excelência, que é, There Is a Light That Never
Goes Out, que também foi considerada pelos críticos como uma das canções mais
influentes de sempre. Apesar da “luz” não ser a mesma do jovem Werther; a de um
amor não correspondido, Morrissey e Marr, acabam por tocar no cerne do mesmo phatos, isto é, na “luz trágica” de um amor até
à desmesura dos sentimentos. A canção ilustra bem as consequências de um amor
tão intenso e desesperado que encontra a glorificação na perpectiva de um fatal
acidente de carro como passagem para o paraíso: “que
forma tão celestial de morrer”.Vamos mais uma vez fazer tese de
que quando cada um de nós equaciona música e vida, porque naquela reencontra e
reescreve a sua identidade mais funda; deixa sair as suas dores e não contém as
alegrias; revive num plano duplo graças à música. Talvez, seja por isso, que
acedemos à íntima dimensão de sonhar acordados. Entre o que sabemos e o que não
sabemos acerca de nós próprios, o que se repete e o que é irrepetível na nossa
vida, o que faz e o que desfaz o sentido, se nos virmos reflectidos no rosto de
alguém - “há uma luz que nunca desvanece.”.
Somos seres olhados ( alguém disse).
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