ENSAIO SOBRE O AFRONTAMENTO


                                                           
Willem de Kooning, Excavasion, 1950, Instituto de Arte de Chicago.
       


O Velho mercenário está a mancar connosco, diz Poussin voltando para o pé do pretenso quadro. Apenas vejo cores confusamente empastadas e contidas por um nunca mais acabar de linhas bizarras, que formam uma muralha de pintura…
- Há uma mulher lá dentro!, exclamou Pobus.

                                              Balzac
                                    “A obra desconhecida”

                                                        
Vera Farmiga


Parte I

Palavras-chave: Ortega y Gasset, amor, sexo, Freud; Princípio do Prazer. Saramago. E onde se diz que é por vontade-própria e não interessa que digam o contrário.


O amor entre um homem e uma mulher deveria ser a experiência mais libertadora, construtiva e completa da vida humana adulta, dizemos nós (e o projecto?). Deveria… contudo, o tipo de união profunda que leva a esta experiência não é fácil de alcançar em se tratando de homens e mulheres dotados de ideais e vontades contraditórias. O instinto de viver e o de conhecer, como se sabe, entram em luta, e a alfinetada, é o caminho da consciência. Ou poder-se-á escrever sobre o amor sem nunca ter caído do cavalo? Segundo Ortega y Gasset em “Estudos sobre o Amor”, o amor entre homem e a mulher está sujeito a três tipos diferentes de distorções.

First of all - A CONQUISTA FÍSICA. Anatomia: entre lisos e estriados, são 639 músculos de atordoamento e sedução. Queriam metafísica? Já lá vamos.

Pois, Gasset diz-nos que a primeira distorção é a conquista física. Na primeira distorção, um dos parceiros (ou ambos) vê o outro basicamente como fonte de prazer físico, sexual.

Os pormenores e concessões do relacionamento são todos arranjados de maneira a aumentar as nossas possibilidades e oportunidades de prazer físico. O parceiro é usado como uma fonte de prazer, às vezes por sua própria vontade, sem ser enganado. Confusão entre Vontade e desejo?

O prazer, sim, por isso não interessa sequer que digam o contrário; o babe ou a babe é visto apenas como uma coisa, um objecto (não confundir com abjeto, também nos calha em sorte), uma condição e uma fonte de auto agrado. Já Saramago dizia: “Se a natureza nos criou da maneira que o fez foi para que fossemos assim, e se nos deu as necessidades que sabemos, foi para que as satisfizéssemos.” Ora nem mais, reduzidos à condição biológica, qual metafísica.


Parte II
Palavras-chave: Adler e Nietzsche, a vontade de ir à pesca (e não é de robalos).

Segunda distorção - A CONQUISTA PSICOLÓGICA. Aqui a distorção é "du" malicioso e "du" perverso, muito mais do que a primeira. “Humanos, demasiado humanos”, não chegámos aqui por acaso... O objectivo aqui, segundo Ortega y Gasset, é o da conquista psicológica. Isto é: os jogos de sedução, as estratégias e os movimentos são mais subtis, destinados a persuadir psicologicamente o outro, a fazer com que ele se apaixone e caia aos pés do conquistador, para ser dominado e submetido, não apenas como um “corpo”, mas como “pessoa”. Ora aqui está a razão da famosa discordância de Adler em relação a Freud –, “Princípio do Poder” subsumido à “Vontade de Poder” de Nietzsche.

Quando a estratégia é bem-sucedida, o suposto enamorado logo perde o interesse pelo que foi vencido. Ele ou ela torna-se apenas mais um troféu na colecção do vencedor. O ditado é velho: quando o peixe está no prato, perde a graça.


Parte III
 Materialismo Psicológico ou Metafisica? Hitchcock e Kim Novak. Materialismo Mecanicista e o bosão de Higgs. Onde se fala desse Sapiens Sapiens, Adão e da sua amada Eva, e já agora de Jung - seu grande místico, julgavas tu que Freud te aturava?

                                                           
Kim Novak

Terceira distorção - A IMAGEM PROJECTADA. Genericamente, quando um homem e uma mulher se apaixonam, não é pela realidade do outro, mas pela “projecção” do que o ser amado deveria ser. Sempre o imaginário, de artistas e de loucos todos temos um pouco. La Palice não diria melhor. Pode ser que a imagem projectada seja derivada de uma mãe, de um pai ou de um sonho. É como os chapéus, Édipos há muitos. Carl Jung, esse grande místico, dizia que todo o homem carregava a sua Eva dentro de si o seu Adão, o que quer dizer que todo o homem carrega no subconsciente a imagem da mulher ideal. O mesmo é dizer, lá está, que toda a Eva carrega dentro de si o seu Adão.
                                                          
James Stewart e Kim Novak in Vertigo de Alfred  Hitchcock

Ora aqui está o segredo do bosão de Higgs, por isso se explica porque certos homens se apaixonam por certo tipo de mulheres e vice-versa. Sempre a bem do engano. A imagem projectada pode ter em alguns casos, muito pouco a ver com a pessoa real. O problema aparece quando insistimos em manter a imagem e querer que o outro se ajuste a ela. Desta forma, estraremos a amar uma fantasia, uma projecção. Conclusão: podemos nem chegar a conhecer a pessoa com a qual vivemos uma vida inteira. Para mais informações sobre a insistência da imagem projectada, sugere-se Vertigo, de Hitchcock. Um dos filmes da vida.
                                                       
Kim Novak actualmente





Nota bibliográfica: Estudos sobre o Amor, Ortega y Gasset, trad. Elsa Castro Neves, Relógio D’ Água Editores, 2002.



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